28 de março de 2009

Perdendo tempo na igreja

Perdendo tempo na igreja
Enéias Teles Borges


Nasci e fui criado numa família religiosa. Aos dezessete anos de idade mudei-me para um colégio interno e lá permaneci por seis anos na condição de aluno. Nestes anos eu concluí o curso técnico de contabilidade e me bacharelei em teologia. Estudei e trabalhei com seriedade. Nunca fugi da verdade, ainda que no começo dos meus questionamentos, eu ia devagar e com muita cautela. Eu vivia bem no meio de um dos berços da tradição cristã brasileira. Por este motivo eu agia com cuidados especiais e evitava externar meus pontos de vista. Eu não questionava pelo simples prazer de questionar e sim pela necessidade de inserir a racionalidade na minha maneira de pensar religião. Eu não precisava ser um gênio para descobrir que eu estava ali e era religioso daquele jeito pelo simples fato de que nasci num lar cristão adventista e que seguia, de forma rigorosa, os costumes eclesiásticos dos ASD (adventistas do sétimo dia). É claro que se a minha família fosse de outra denominação cristã e tivesse tido o mesmo zelo, eu hoje não seria um indivíduo recheado da cultura adventista. É óbvio que eu teria outra cultura religiosa.

É claro que eu não poderia (como não pude), dizer isso às pessoas em derredor. Eu seria, sem dúvidas, objeto das longas orações intercessórias. Por uma questão de conveniência e consciência eu não poderia sair alardeando minha forma de pensar. Sempre foi de fundamental importância respeitar as opiniões dos outros e evitar tecer comentários sobre assuntos considerados complexos demais para determinadas pessoas. Meus questionamentos seriam abomináveis para muitos e incompreensíveis para outros.

Mesmo assim eu nunca procurei me afastar deste meio. O ambiente sempre foi e será bom. Boas escolas, boas atividades e bons amigos. Dentro desse contexto de cultura religiosa eu sempre me firmei. Os membros de minha família estudaram e estudam nesse ambiente que é de exuberância e de excelência.

Por que tracei as linhas acima? Para deixar bem claro que não repudio minhas origens e até me sinto grato por tê-las em minha maneira de viver. Sempre foi possível separar cultura religiosa da religião efetiva. Vivi e sigo vivendo nesta cultura religiosa e não sou único. Faço parte da maioria. A diferença é que admito viver uma cultura ao passo que outros insistem em pensar que vivem uma religião.

Cultura ou religião há algo comum em nosso proceder: a maneira como vivemos e interagimos. Uma vez por semana (é quase regra) a comunidade se reúne. No nosso caso o dia é o sábado e o lugar é o templo. O templo que frequentamos está entre os que possuem o maior índice de cultura (acadêmica). Refiro-me ao fato de que são professores e alunos, na maioria, o que torna o lugar repleto de conhecimentos e capacidades potenciais.

O que seria de se esperar de uma estrutura assim, um dos principais berços da cultura protestante no Brasil? O natural seria esperar aquilo que o lugar sempre ofereceu: boa música e boas mensagens. Não importa, no meu caso, se tenho cultura ou religião. Importa o fato de que eu me acostumei com o alto nível das mensagens proferidas naquele templo. Desde 1979 eu por ali passei e continuo passando.

Acontece que aquele templo não tem sido mais o mesmo. As mensagens bem elaboradas e bem expostas estão se tornando raras. Com todo o respeito aos membros das comunidades pentecostais eu tenho que dizer que nós estamos ficando parecido com eles. Tanto no conteúdo quanto na forma! O que me leva a exclamar: se eu quisesse ser pentecostal eu mudaria de contexto cultural e se fico ali é justamente pela maneira consistente que sempre existiu.

O que temos lá agora? Boa música e mensagens pífias! Num dos sábados passados eu ouvi um dos pastores sugerindo aos irmãos que testassem a fidelidade divina por noventa dias, devolvendo o dízimo e ofertando! Ele asseverava que bênçãos materiais viriam! Este tipo de mensagem lembra algum aglomerado pentecostal? Claro que sim! Estamos permitindo a entrada da teologia da prosperidade naquela instituição quase centenária! Desde quando os ASD vinculam dízimos e ofertas a bênçãos materiais? A grande bênção não está em ser liberal e esperar (se esperar) recompensa espiritual? Estou esperando o momento em que todos serão conclamados a bater palmas para Jesus, o que já vêm acontecendo numa classe “autônoma” no mesmo ambiente. Uma pena!

Cresci num contexto de cultura religiosa e não lamento por isso. Mas ir ao templo, que frequento desde 1979, tem se mostrado uma perda de tempo. O único tempo que não tenho perdido (por lá) é quando ouço as músicas durante o cerimonial e quando dali me desloco para rever os amigos e vivenciar a segunda parte das atividades sabáticas.

Para entender o que aqui estou postando eu sugiro aos que pertencem às comunidades dos ASD algo bem simples: recuem no tempo, leiam os escritos tradicionais e busquem a doutrina que deu início a esta mensagem tradicionalista. Comparem com o que estão ouvindo hoje. Não me refiro aos aspectos culturais da mensagem, mas ao conteúdo e forma de apresentar. É lastimável e chega a causar profunda tristeza.

Tem sido melhor (muito melhor) ficar em casa, pegar o cãozinho de estimação e dar uma longa volta no condomínio. Tomar um banho, fazer uma boa leitura, navegar na internet e esperar o tempo passar... O chato é ouvir de alguns alienados: não importa o que vem do púlpito, o importante é estar na igreja!

Existem duas maneiras de se perder tempo na igreja: de forma consciente e de forma inconsciente. Eu fujo das duas. Eu me recuso a assistir ao espetáculo: pastores fingindo que alimentam e ovelhas fingindo que são alimentadas...
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